Potências Negras: Frente Negra Gaúcha lança programa para fortalecer lideranças e ampliar participação política

Frente Negra • 24 de setembro de 2025

Potências Negras: Frente Negra Gaúcha lança programa para fortalecer lideranças e ampliar participação política

Vanessa Mulet e Juliano Guedes: educação como prática emancipatória. Crédito: Marcos R. Pereira Feijão

Projeto Potências Negras chega à fase das inscrições para as formações junto às comunidades beneficiadas

Por Silvia Abreu*

O Programa “Potências Negras”, iniciativa da Frente Negra Gaúcha (FNG) viabilizada por emenda parlamentar da deputada federal Daiana Santos, segue avançando em suas etapas de implementação. O projeto tem como objetivo formar e fortalecer lideranças negras em comunidades periféricas do Rio Grande do Sul, por meio de cursos que integram letramento racial, formação política e estratégias de mobilização social.


Desde o lançamento do edital, a equipe responsável concluiu diferentes fases preparatórias: análise de currículos, entrevistas com candidatas(os), avaliação pela comissão técnica, publicação dos resultados e assinatura dos contratos com os facilitadores selecionados. Com essas etapas cumpridas, o projeto chega agora a um momento decisivo: o início da divulgação das inscrições para as formações junto às comunidades beneficiadas.

O curso conta com facilitadoras, selecionadas não apenas pela qualificação técnica, mas também pelo traquejo e pela linguagem prática, conectadas às realidades periféricas. Crédito: Marcos Pereira “Feijão”

A proposta pedagógica parte da educação como prática emancipatória, inspirada em referências como Paulo Freire, Sueli Carneiro, Lélia Gonzalez, Silvio Almeida e Frantz Fanon. Ao longo do curso, cerca de 100 participantes serão capacitados em conteúdos que abrangem justiça racial, participação política, comunicação e valorização das trajetórias da população negra.


Nesta entrevista, conversamos com a presidente da Frente Negra Gaúcha (FNG), Vanessa Mulet, que avalia a importância deste projeto para a entidade, e com o coordenador técnico do Potências Negras, o administrador de empresas e especialista em Letramento Racial, Juliano Guedes, que fala de suas expectativas com a pedagogia a ser aplicada.


Vanessa Mulet é pedagoga com especialização em Gestão e Direitos Humanos, com mais de dez anos de experiência em responsabilidade social, educação e programas socioeducativos. Especialista em gestão de projetos de impacto, ela atua na articulação de parcerias, liderança de equipes e desenvolvimento de soluções para equidade racial, inclusão e diversidade. Como presidenta da Frente Negra Gaúcha, alia visão estratégica e prática social para promover transformação em contextos corporativos e comunitários.


Juliano Guedes é administrador de empresas como Mestrando em Memória Social e Bens Culturais com a pesquisa "Silêncios, Apagamentos e Resistências: o Letramento Racial como chave para reconstrução da Memória Social Brasileira". É especialista em gestão de pessoas, estratégias e negócios, em gestão da qualidade e produtividade e em Educação Profissional.

 

Da vivência à ação: FNG cria Potências Negras para formar novas lideranças e fortalecer comunidades:


“A principal motivação nasce da nossa própria vivência. As comunidades negras já carregam potência, mas muitas vezes não têm acesso às ferramentas necessárias para estruturar sua atuação”, afirma Vanessa Mulet, presidente da FNG.

 

Pergunta: Qual foi a principal motivação da Frente Negra Gaúcha para criar o Programa Potências Negras?

Vanessa: A principal motivação nasce da nossa própria vivência. Sabemos que as comunidades negras, periféricas e quilombolas já carregam potência e lideranças, mas, muitas vezes, não têm acesso às ferramentas necessárias para estruturar e profissionalizar sua atuação. O Potências Negras surge para transformar essa energia em ação organizada, fortalecendo quem já está em campo e, ao mesmo tempo, estimulando pessoas que desejam assumir papéis de liderança, dentro e fora do território. Nosso objetivo é criar condições para que mais pessoas participem ativamente da vida cidadã e política, ampliando a presença negra nos espaços de decisão. Em um contexto em que a luta contra o racismo exige também incidência institucional, esse programa representa um passo estratégico nessa direção.


Pergunta: Como o projeto dialoga com a história de luta da FNG e sua atuação no Estado?

Vanessa: O Potências Negras é continuidade e reinvenção da nossa história. A Frente Negra Gaúcha sempre esteve comprometida em denunciar o racismo e cobrar reparação, mas também em construir alternativas. Ao longo dos anos, nos consolidamos como uma organização que alia mobilização de base com ações estratégicas, pensamento político e atuação sistemática, sempre com foco em políticas públicas. Esse projeto honra a memória de nossos ancestrais e das gerações que sustentaram a FNG, ao mesmo tempo em que prepara uma nova geração de lideranças. Ao fortalecer lideranças já atuantes e estimular novas pessoas a ocuparem esse lugar, dentro e fora do território, o curso amplia nossa capacidade de incidir de forma organizada, participativa e consistente nas transformações que o Estado precisa.


Pergunta: Que impactos tu esperas que o curso traga para as comunidades periféricas contempladas?

Vanessa: O impacto esperado é a multiplicação da autonomia. Nossa meta não é formar apenas cinco ou dez líderes, mas potencializar cada participante como ponto de irradiação de conhecimento e mobilização, dentro de sua comunidade. Queremos ver projetos mais estruturados, associações de bairro mais fortalecidas e uma presença política mais qualificada. Ao mesmo tempo, buscamos despertar novas lideranças que ainda não ocupam esses espaços, ampliando a rede de agentes de transformação, dentro e fora do território. O objetivo é estimular uma participação cidadã e política mais ativa, capaz de influenciar decisões locais, regionais e estaduais. Queremos que a periferia seja reconhecida não como espaço de carência, mas como território de inovação, força e protagonismo, onde se constroem soluções próprias e se incide diretamente em políticas públicas.


Pergunta: O que diferencia o Potências Negras de outras formações voltadas a lideranças negras já realizadas no RS?

Vanessa: O diferencial está na prática, na vivência e na intencionalidade política. O Potências Negras não é uma formação acadêmica distante, mas um processo construído por quem vive a luta, para quem a enfrenta diariamente. Nosso corpo docente é formado majoritariamente por ativistas, educadores e profissionais negros que conhecem de perto a realidade das comunidades. Mais do que transmitir conteúdos, o curso foca na criação de projetos aplicáveis nos territórios de origem e no estímulo a novas lideranças, inclusive fora desses territórios. Com isso, buscamos formar agentes capazes de atuar, tanto no fortalecimento comunitário, quanto na participação cidadã e política em diferentes esferas, influenciando políticas públicas e disputando espaços de decisão.


Pergunta: Como a FNG pretende acompanhar os desdobramentos e resultados das formações depois da conclusão do curso?

Vanessa: A conclusão do curso é, para nós, um ponto de partida. A Frente Negra Gaúcha pretende manter uma rede de acompanhamento e apoio, oferecendo mentorias, conectando projetos a parceiros estratégicos e garantindo suporte técnico para que cada iniciativa tenha sustentabilidade. Nosso compromisso é de longo prazo: fortalecer lideranças já existentes e acompanhar também quem inicia agora sua caminhada, dentro e fora do território. Queremos consolidar uma rede de agentes que dialoguem entre si, troquem experiências e mantenham um ciclo de fortalecimento coletivo. Mais que números, os resultados que buscamos estão na capacidade de gerar impacto real nas comunidades, ampliar a participação cidadã e política de pessoas negras e sustentar processos de mudança duradouros, com incidência direta em políticas públicas.

 

Juliano Guedes:


‘Esse movimento também significa enfrentar o apagamento histórico que tantas vezes tentou silenciar a contribuição e a resistência negra no Brasil’

 

Pergunta: Quais foram os principais critérios para a escolha dos facilitadores de formação?

Juliano: Os critérios partiram do que foi estabelecido no edital, em que tivemos que definir requisitos de entrada como: formação superior em áreas das ciências humanas e sociais, experiência mínima de três anos em formações sobre letramento racial, antirracismo ou formação política, além da apresentação de propostas metodológicas alinhadas ao projeto. Entretanto, mais do que a qualificação técnica, buscamos perfis que tivessem o traquejo e a linguagem prática, conectados às realidades periféricas. Isso significa valorizar experiências e trajetórias de engajamento comunitário, fruto da atuação em movimentos sociais, instituições públicas ou na educação popular. Também foram diferenciais a capacidade didática, a escuta ativa e a sensibilidade racial e comunitária, para garantir que os conteúdos dialoguem diretamente com a vivência dos participantes.


Pergunta: O curso foi estruturado em dois módulos – letramento racial e formação política. De que forma essas áreas se complementam na prática pedagógica?

Juliano: O letramento racial é de suma importância porque possibilita que negros e negras tenham acesso e compreensão da sua própria história sob um outro prisma, que os empodere, que ajude a reconhecer as dinâmicas raciais e que os preparem para desafiar as estruturas de poder racializadas que ainda permeiam a sociedade. Esse movimento também significa enfrentar o apagamento histórico que tantas vezes tentou silenciar a contribuição e a resistência negra no Brasil

A formação política, por sua vez, complementa esse processo ao trazer o olhar para as políticas de emancipação do povo negro, as ações afirmativas e a representatividade nos espaços de poder. É nesse ponto que o saber crítico se converte em ação prática, fortalecendo a capacidade política-comunitária.

Assim, os dois módulos se complementam como parte de um mesmo ciclo: o letramento racial promove a consciência crítica e histórica, enquanto a formação política capacita para a ação transformadora e emancipatória. É o caminho que chamamos de “da consciência à ação política”, base do Programa Potências Negras.”


Pergunta: Como foi pensada a metodologia das aulas para valorizar os saberes e trajetórias da população negra?

Juliano: A metodologia foi construída em uma perspectiva dialógica e participativa, além de conceitual, mas reconhecendo os saberes que os participantes já trazem de suas vivências. Para isso, utilizamos dinâmicas sempre contextualizadas com a realidade da população negra e da realidade comunitária. Os encontros são organizados a fim de permitir trocas e a construção coletiva do conhecimento. A cada etapa aplicamos avaliações diagnósticas, formativas e de reação, garantindo ajustes constantes ao processo. E, ao final, os participantes desenvolvem um projeto político comunitário, que serve como produto de certificação e devolutiva prática para suas comunidades.


Pergunta: Que perfil de participantes o projeto pretende alcançar neste processo de inscrição?

Juliano: O projeto busca lideranças afrodescendentes das comunidades periféricas, com foco especial no empoderamento de mulheres negras. Esperamos alcançar lideranças comunitárias, ativistas, integrantes de coletivos e pessoas com potencial de mobilização social.

A proposta é formar sujeitos políticos que, ao final do programa, estejam mais preparados e motivados para atuar como líderes conscientes e comprometidos com a igualdade racial, ampliando a representatividade negra nos espaços de poder e decisão e fortalecendo uma rede articulada de agentes de transformação social.


Pergunta: Quais serão os principais desafios na implementação do curso e como a coordenação está se preparando para enfrentá-los?

Juliano: O grande desafio será a mobilização comunitária: garantir que as lideranças periféricas se engajem, permaneçam e consigam vivenciar toda a jornada formativa. Isso exige uma forte parceria com entidades comunitárias e movimentos locais, que são pontes fundamentais para chegar ao nosso público-alvo.

Outro ponto é o esmero pela qualidade da entrega, pois sabemos da responsabilidade desse projeto. Trabalhamos para que cada etapa seja conduzida com excelência, já que nosso objetivo não é apenas oferecer formação, mas forjar o protagonismo de lideranças negras que, em um futuro próximo, possam ocupar espaços representativos de poder, ainda negados a nós, apesar de representarmos um percentual significativo da população no Rio Grande do Sul e sendo maioria absoluta no País.


Pergunta: Que impactos tu esperas que o curso traga para as comunidades periféricas contempladas?

Juliano: Esperamos que o curso fortaleça um ciclo virtuoso, no qual cada participante volte para sua comunidade mais preparado para agir, propor e ocupar espaços de decisão. O impacto vai muito além do indivíduo: cada liderança se torna um multiplicador, gerando referências positivas, mobilizando iniciativas comunitárias e incidindo politicamente. Em síntese, que o programa promova a formação de lideranças negras com consciência racial fortalecida, capazes de disputar espaços de poder, ampliar candidaturas negras, adotar uma postura crítica sobre a política e se articular em rede. Assim, formamos sujeitos políticos comprometidos com a promoção da igualdade racial e com a transformação social em suas comunidades.


*Silvia Abreu é jornalista profissional e produtora cultural.
Atua como Consultora em Comunicação da Frente Negra Gaúcha.  


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